Imperador promulga emenda “Frankenstein” e Chanceler mobiliza partidos para manifesto

Emenda constitucional entra em vigor após debate entre governistas e senadores que enterraram projeto federalista da Chancelaria.

 

Munique. O imperador Guilherme III promulgou na noite desta sexta-feira a emenda constitucional aprovada pelo Senado no passado dia 2 após sensível debate sobre seu conteúdo. Com a assinatura imperial o texto passa a viger imediatamente e agora a constituição alemã versa sobre as competências, garantias e direitos dos estados.

Não foi com pouca discussão que o último dia útil do alemão comum começou. Através de um pronunciamento desde a Münchner Residenz (sede da Chancelaria na capital), o chanceler ainda reverberava a alcunha de “Frankenstein” por ele dada ao novo texto, tentando atribuir-lhe um caráter análogo à referida criatura formada por partes de cadáveres. Portanto, a adjetivação não foi nada boa. Ainda mais se considerarmos um detalhe ligeiro passado em desapercebido, pois na história criada por Mary Shelley em 1818, o notório monstro foi criado por um cientista louco chamado Victor Frankenstein. E, coincidências ou não, o orador do Senado Imperial e arquiduque da Áustria também se chama Victor! Será que foi isso mesmo?

É absolutamente possível que tudo seja apenas uma coincidência, mas nas tintas de Afonso Filipe de Hohenzollern a “Criatura de Oldenburg” (com a licença das devidas vênias) causaria ao Império, mas sobretudo aos seus estados autônomos, uma verdadeira monstruosidade (com a licença dos devidos trocadilhos). Os argumentos dos partidários da tese proveniente da Residenz continuavam a insistir na ideia da vulnerabilidade institucional dos estados em razão do mecanismo de intervenção caso o ente não lograsse sucesso no seu ajuste aos dispositivos constitucionais recém criados.

A tese foi confrontada pelo arquiduque Victor e pelo rei hanoveriano Jorge Augusto que pedagogicamente buscaram demonstrar, mas aparentemente sem grande sucesso, que no lugar de restringir as autonomias dos estados estas foram ampliadas e direcionadas para garantir interesses comuns, como o prover o ordenamento jurídico de cada ente conforme suas próprias idiossincrasias e a criação de políticas públicas assertivas em matéria de integração social e expansão demográfica da Alemanha, dentre outros aspectos da agenda regional.

Os governistas também ventilaram o argumento, com um pouco mais de dificuldade, que o Senado não observou o devido processo legislativo. Na interpretação do grupo a Câmara Alta, no lugar de modificar o texto originado pela Dieta Imperial, deveria tê-lo rejeitado e substituído por outro que seria apreciado pelo parlamento, recomeçando do zero o processo. O debate público, no entanto foi interrompido pela hora do almoço com a inserção de outras amenidades e outras questões que arrastaram para a sombra a combinação teórica dos partidários da causa federalista.

Manifesto suprapartidário

Com a preocupação de reforçar seu enredo de defesas à contra-argumentação dos integrantes do Senado e do próprio imperador, o chanceler Afonso Filipe articula com seus apoiadores a elaboração de um manifesto suprapartidário para jogar com os príncipes imperiais no campo político.

O movimento lograria convergir os governistas Partido Federalista (FPDV) e Aliança Democrática Cristã (CDA) com o independente União Popular Tradicionalista (TVB) para juntos riscarem com a espada uma linha entre o Gabinete e a Câmara Alta, inaugurando um novo capítulo na novela política alemã.

Até o fechamento desta edição a aludida declaração não chegou a ser divulgada, mas fontes consultadas pelo VN asseguram que há um esforço coordenado nestas agremiações de romanticamente flexionarem os músculos e marcar posição ideológica frente a elite do Império. O documento deverá arriscar a tese presente nas declarações do chanceler, de que ao modificar o texto da PEC e votá-lo, o Senado teria desrespeitado as autonomias estaduais em suas competências e indo contra a vontade popular, uma vez que os partidos – baseados nos estados – se colocam como representantes do interesse das comunidades locais.

É interessante esclarecer que na Alemanha o parlamento é organizado em duas Casas, a Dieta Imperial, eleita por sufrágio universal, e o Senado Imperial, formado por membros vitalícios nomeados pelo imperador. Como não houveram eleições em julho para renovar a composição da Câmara Baixa (por falta de clima político), a Coroa alemã não teve outra saída a não ser dissolvê-la seguindo a previsão constitucional e atribuir ao Senado a plena competência legislativa.

Isso incorre em uma circunstância a qual Afonso Filipe governa o Império sem ter uma base parlamentar, pois os senadores não representam partidos, nem mesmo o único membro da Casa filiado a um (o rei Venceslau da Boêmia, ao FPDV). Sem uma base, o chefe do Governo depende do apoio do imperador para permanecer no cargo e com toda esta atmosfera provocada pela nova emenda constitucional seria plausível dizer que a sustentação do chanceler ficasse fragilizada.

O manifesto tripartite, então, poderia servir como um esforço pela construção de uma base enlaçando-se políticos sem mandato para polarizar com o Senado na questão das autonomias estaduais e, talvez, criar espaço aos partidários do federalismo na iminente assembleia constituinte. A conferir.

Entrevista

SSAI Victor, Arquiduque da Áustria
Orador do Senado Imperial da Nação Alemã

Alteza, qual sua impressão sobre o pronunciamento do Chanceler pela Emenda Constitucional 3/2021?

Entendo que faz parte do jogo político e do ambiente democrático ter divergências de opiniões. O projeto de emenda constitucional, chamado de “PEC do Federalismo”, aprovado pela Dieta, continha inconstitucionalidade na sua forma. Essa inconstitucionalidade foi apontada pelo Rei de Hanôver, chefe do Poder Judiciário, afirmando que a alteração da forma de Estado unitário para federativo deveria ser feita via Assembleia Constituinte. Em outras palavras, o Império Alemão precisaria de uma nova Constituição para que o federalismo fosse adotado. Dessa forma, o Senado Imperial, como casa revisora, utilizou-se de sua prerrogativa constitucional para adequar a PEC ao que, constitucionalmente, era adequado.

O Chanceler afirma que o Senado não poderia alterar a PEC, devendo ter que arquiva-la, para que se fosse proposta uma nova PEC pelo Senado. Qual sua interpretação sobre esse tema?

Essa afirmação do Chanceler não tem embasamento jurídico. A Constituição Imperial concede ao Senado a prerrogativa de casa legislativa revisora de propostas de emenda constitucional, não limitando o escopo de atuação do Senado (artigo 23-C). Além disso, é importante frisar que a Coroa dissolveu a Dieta Imperial, transferindo suas prerrogativas ao Senado (parágrafo 1º, artigo 23-C). Apenas para conjecturar, caso a afirmação do nobre Chanceler tivesse embasamento, o Senado iria arquivar o bom texto aprovado pela Dieta, para, posteriormente, o próprio Senado propor texto semelhante, porém sem os vícios constitucionais. Faz sentido?

O Chanceler e a Aliança Democrática Cristã entendem que a PEC foi desfigurada pelo Senado Imperial, não tendo sido atendido os anseios federalistas. Qual sua opinião a respeito dessas alegações?

Os comentários deles, os quais respeito, porém não concordo, são que a alteração da ideia de “federação” para “autonomia devolvida pelo Imperador aos Estados Imperiais” teria por si só desconfigurado o projeto. No meu ponto de vista, esse comentário não procede. Com a promulgação da Emenda Constitucional n. 3/2021 mantiveram-se as mesmas prerrogativas e direitos previstos na PEC encaminhada pela Dieta Imperial.

Isso quer dizer que, a partir de hoje, os Estados Imperiais gozam de maior autonomia do que outrora, com amplos direitos de se auto-organizar e administrar. A autonomia, devolvida pelo Kaiser, não poderá ser reduzida ao bel prazer do Imperador ou do Parlamento Alemão, pois passou a ser um princípio fundamental do Império (artigo 1º, alínea “d”). Logo, essa autonomia concedida aos Estados Imperiais somente poderá ser reduzida por uma Assembleia Constituinte.

Da mesma maneira, apenas por analogia, os Estados Imperiais gozam, a partir de hoje, de semelhante autonomia que é dada pela União aos estados brasileiros, onde os estados podem se auto-administrar desde que nos limites impostos pela Constituição da República Federativa do Brasil, tal como no Império Alemão. Por mais que o Império Alemão adote uma forma de Estado unitário, o centro de poder está desconcentrado, regionalizado e garantido pela Constituição Imperial, muito semelhante ao que ocorre no Brasil.

Se formos comparar a Estados macronacionais unitários descentralizados, podemos dizer que o nosso novo modelo é próximo ao que existe no Reino Unido da Grã-Bretanha, onde Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte possuem grande autonomia através da devolução dada pela Coroa e Parlamento britânicos.

Uma última questão, Alteza. Quais serão os planos desde momento para a Áustria diante da vigência da nova redação constitucional?

Primeiramente, nós faremos revisão do Diploma de Fevereiro (Constituição austríaca) de forma a garantir que esteja adequada com as novas garantias dadas pela Constituição Imperial. Na sequência, planejamos organizar administrativamente nosso território. Também normatizaremos a nobiliarquia, considerando as novas regras publicadas pelo Kaiser hoje (mais detalhes a seguir). Nesse ínterim, sendo viável, formaremos um governo para fomentar o desenvolvimento austríaco

Remédio amargo para a febre por títulos de nobreza

Foi com alguma surpresa que os monarcas estaduais tomaram conhecimento que o imperador havia publicado um adendo ao decreto que regulamenta o fons honorum dos príncipes imperiais estabelecendo limites mais firmes (e estalando benevolente o seu chicote) para a criação de títulos nobiliárquicos pelos sete estados alemães.

Com a medida o Nymphenburg aperta a torneira da fonte de honra que fora atribuída aos estados e assim busca evitar, por critérios como parcimônia e modéstia, a autocriação de títulos ou mesmo escambo nobiliárquico que poderia ocorrer no âmbito local. E isso na esteira das discussões sobre as autonomias estaduais encabeçados pelo rei da Batávia.

Agora os monarcas não poderão pactuar títulos como meio de troca por serviços ou qualquer outro expediente, seja entre si ou com dignitários estrangeiros, e apenas cidadãos alemães residentes nos seus respectivos territórios há pelo menos seis meses poderão ser elevados às honras do estamento nobiliárquico estadual, sob uma constrangedora pena de cancelamento do novo título.

Quanto à entrega de medalhas e ordens de cavalaria não há tamanha restrição, mas a regra parcimoniosa continua valendo e também não há como prever se esta decisão terá algum efeito sobre a temperatura do debate federativo.

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